quarta-feira, 15 de novembro de 2017

CONSTRUÇÃO DA PEDAGOGIA NAS CRECHES

Foram quase duas décadas afastada da sala de aula, quando retornei observei uma pedagogia muito diferente daquela que havia me formado. Mas algo me incomodava na rotina dessa nova escola, ou seja, uma pedagogia atual, mas o cotidiano da escola galgado em atitudes oriundas de décadas passadas. Eu, observava um entrave entre o corpo docente e as famílias das crianças. De um lado era exigido dos educadores atitudes que caberiam exclusivamente aos progenitores, por outro lado, os professores exigiam comportamentos desses pais dentro das concepções atuais de Educação, ou seja, a família não poderia mais atribuir a creche a obrigação de apenas cuidar dos seus filhos, pois  na nova visão educacional vigente, a Instituição Creche  desenvolve papel educativo e acompanhada das famílias. 

A mencionada creche tem sua criação através de um grupo de casais que se uniram com o intuito de criar um espaço para "cuidar" de crianças, enquanto suas mães buscavam colocação no mercado de trabalho. Imaginava daí o surgimento, naquela instituição, daquelas características paternalistas e solidárias, quase que uma instituição de caridade, o que ao meu ver tinha explicação, mas não fundamento diante nas novas concepções do papel educacional  das escolas de educação infantil. Atribuía a uma construção histórica e cultural daquele bairro localizado em uma região pobre da cidade e a imagem da creche vinculada à instância de assistencialismo.

 A compreensão do que foi narrado acima veio com a leitura das Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico Raciais  possibilitando um novo olhar mais sensibilizado para essa questão assistencialista por parte das famílias. Até pouco tempo fazíamos toda e qualquer tipo de higienização com os alunos, sob alegação que as crianças estavam naquele espaço para serem cuidadas, enquanto as progenitoras iam em busca de sustento. 

Reafirmo que trata-se de um questão histórica e cultural na medida que lemos as Orientações, esta relata  o surgimento abrigos, refúgios para crianças e filhas de mães operárias, nesse fase, por volta do século XVII e XVIII a infância passa ser considerada uma fase da vida que merece atenção e já no século XX, as instituições atendem às crianças como medida de saúde pública. Nessa época o discurso era em torno de educar para moralizar, civilizar e  domesticar calcados em valores rígidos do cristianismo. Prevalecia igualmente a preocupação com o sono, higiene, alimentação e rotinas rígidas ( tal e qual a escola que descrevi acima). Eram consideradas um  espaço de controle social e tinha como objetivo evitar a vadiagem e a delinquência infantil. As preocupações de caráter pedagógico e cognitivo estava a margem dessas escolas. Nota-se, desde então, que havia uma concepção de apenas cuidar vinculado à prática assistencialista que marcou as creches daquele período e ainda se encontra arraigada em muitas escolas infantis dos tempos atuais.

A mudança desse padrão educacional veio com os movimentos populares de  luta por creches, exigindo do Estado a criação de redes públicas de Educação Infantil. Os governos municipais em conjunto com  organizações de moradores, clubes de mães, associações de bairros implementam programas pré escolares.

Meados da década de 80 a infância é colocada na agenda pública e a criança passa a ser sujeito de direito. Áreas como saúde, bem estar social, Ministério Público, Conselhos Tutelares e Defesa dos Direitos da Criança passam a trabalhar em conjunto com a ideia de Criança Cidadã.

Outro salto promissor veio com a promulgação da Constituição Federal de 1988, ao reconhecer em seu artigo 208, inciso IV o caráter educativo das creches passando a ser incorporada à área da educação,  encontrando reforço na Lei de Diretrizes da Educação Nacional de 1966, onde a Educação Infantil passa a ser parte integrante da educação básica, compreendida como a primeira etapa.

fonte: Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico Raciais, pg. 34-37

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